Cientistas destacaram que o monitoramento de vírus com potencial zoonótico é essencial para o desenvolvimento de vacinas
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Um grupo de coronavírus presentes em morcegos, com estrutura semelhante à do vírus da síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV), pode estar a poucas mutações de conseguir infectar humanos. A conclusão é de um estudo publicado na revista Nature Communications, conduzido por pesquisadores da Universidade Estadual de Washington (WSU), do Instituto de Tecnologia da Califórnia e da Universidade da Carolina do Norte.
O trabalho analisou os chamados merbecovírus, um subgrupo de coronavírus que inclui o MERS-CoV, identificado em 2012 e responsável por uma taxa de mortalidade estimada em 34%.
O foco principal do estudo foi um subgrupo específico de merbecovírus conhecido como HKU5, que demonstrou potencial para cruzar a barreira entre diferentes espécies.
De acordo com os pesquisadores, embora a maioria dos merbecovírus não apresente risco imediato para humanos, o grupo HKU5 exibe uma estrutura de infecção preocupante. Esses vírus foram encontrados em regiões da Ásia, Europa, África e Oriente Médio, e circulam principalmente entre morcegos.
O estudo aponta que eles já são capazes de utilizar um receptor celular chamado ACE2, o mesmo utilizado pelo vírus SARS-CoV-2, causador da covid-19.
“O que descobrimos é que os vírus HKU5 podem estar a apenas um pequeno passo de se espalharem para os humanos”, afirmou o virologista Michael Letko, da Faculdade de Medicina Veterinária da WSU, que liderou a pesquisa.
“Esses vírus estão tão intimamente relacionados ao MERS que precisamos nos preocupar com o que pode acontecer se eles atingirem populações humanas”, acrescentou Lekto.
Processo de descoberta
A pesquisa utilizou partículas virais artificiais com a proteína spike para simular a capacidade de infecção dos vírus. Os resultados mostraram que pequenas mudanças nessa estrutura aumentam significativamente a chance de os vírus se ligarem a receptores de outras espécies.
Em um caso documentado por outro estudo, um vírus HKU5 identificado na China já havia infectado visons, o que reforça a possibilidade de transmissão entre diferentes animais.
Além das análises laboratoriais, os cientistas recorreram a ferramentas de inteligência artificial para modelar a interação entre a spike viral e o receptor ACE2.
A pesquisadora Victoria Jefferson, da WSU, utilizou o sistema AlphaFold 3 para prever como essas ligações se formam em nível molecular. A ferramenta produziu resultados com alto grau de precisão, confirmando dados de estudos anteriores feitos com métodos tradicionais.
O avanço dessas análises pode ajudar na antecipação de novos surtos, afirma os cientistas do estudo. A equipe destaca também que o monitoramento de vírus com potencial zoonótico é essencial para o desenvolvimento de vacinas e estratégias de contenção antes que eles se tornem ameaças reais à saúde pública.
“Embora ainda não haja evidências de que esses vírus tenham infectado pessoas, o potencial existe. E isso exige atenção”, disse Letko.