Pesquisadores modificaram insetos para conseguir compreender mais sobre transtorno

Foto: Caitlyn Harris/University of Utah Health

Pesquisadores da Universidade de Utah, nos Estados Unidos, criaram pela primeira vez moscas geneticamente modificadas que podem desenvolver dependência de cocaína, oferecendo um modelo inovador para o estudo e tratamento do transtorno do uso da droga.

A pesquisa, publicada no “Journal of Neuroscience”, abre caminho para a descoberta mais rápida de terapias eficazes para um vício que afeta cerca de 1,5 milhão de pessoas nos Estados Unidos.

Embora moscas e humanos reajam de forma semelhante à cocaína — com estímulo inicial seguido por incapacitação em doses elevadas —, os insetos normalmente evitam a substância devido ao seu sabor amargo, o que dificultava o uso desses animais como modelo para estudos de dependência. Cientistas identificaram que a ativação de receptores gustativos responsáveis por detectar sabores amargos nas patas das moscas bloqueava a preferência pela droga.

Ao inibir esses receptores de sabor amargo, as moscas passaram a preferir voluntariamente água açucarada com cocaína em baixas concentrações, demonstrando um comportamento de consumo dependente em apenas 16 horas após a primeira exposição. Essa descoberta permite estudar os mecanismos genéticos e biológicos do vício de forma acelerada.

Com aproximadamente 75% dos genes humanos relacionados a doenças também presentes nas moscas, o modelo oferece a possibilidade de analisar centenas de genes associados à dependência em curto espaço de tempo. Isso viabiliza a identificação rápida de potenciais alvos terapêuticos que podem ser depois testados em modelos mamíferos mais complexos.

“Podemos ampliar a pesquisa”, disse o pesquisador Travis Philyaw. “Conseguimos identificar genes de risco que seriam difíceis de descobrir em organismos mais complexos, e depois passamos essa informação para pesquisadores que trabalham com modelos mamíferos. Eles, então, conseguem encontrar alvos para tratamentos que facilitam a transição do estudo do comportamento animal para o desenvolvimento de terapias humanas.”

Segundo os autores, além de facilitar o desenvolvimento de tratamentos, a pesquisa básica com o cérebro simples das moscas pode revelar percepções inesperadas sobre o funcionamento do vício e, até mesmo, da mente humana. A equipe ressalta a importância dessa abordagem para ampliar o conhecimento científico e sua aplicação na saúde pública.

“Podemos realmente começar a entender os mecanismos da escolha pela cocaína, e quanto mais você entende sobre o mecanismo, maior a chance de encontrar um tratamento que atue nele”, afirmou o pesquisador Adrian Rothenfluh, professor associado de psiquiatria da Universidade de Utah e autor sênior do estudo. “A ciência básica é importante, e você nunca sabe quais descobertas empolgantes pode fazer que acabarão sendo relevantes para compreender a condição humana.”