Como a vida acelerada no Japão prejudica a saúde mental na comunidade e o que fazer para combater as crises de ansiedade e pânico
Texto: Ana Paula Ramos/Record TV Japan
Foto: AdobeStock
Crises de ansiedade e ataques de pânico são transtornos que indicam que algo vai mal com a saúde mental do indivíduo. Não há dados sobre a ocorrência dessas condições na comunidade brasileira no Japão, mas os numerosos relatos em grupos online e o depoimento de terapeutas que atuam na comunidade indicam que sofrer da síndrome do pânico não é algo tão fora do comum.
Chamado de “TP” no meio médico (Transtorno do Pânico), a condição se caracteriza por um medo extremo, mal-estar, crise de ansiedade que surge repentinamente e acompanha sintomas físicos, de acordo com a Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde do Brasil. O problema causa um desequilíbrio no indivíduo, que sofre com o medo intenso de morrer, enlouquecer, perder o controle ou ter novos ataques.
Para quem sofre com ansiedade constante e estresse da vida corrida no Japão, o trabalho intenso na fábrica, desencadear ataques de pânico ou outro sofrimento psíquico é um risco real. E quem já passou por isso precisou iniciar tratamentos com remédios e terapias na tentativa de recuperar o bem-estar.
Cristiane Yamada, de 36 anos, vive na província de Mie e lida com a síndrome do pânico há 10 anos. Ela acredita que teve a condição desencadeada pelo excesso de trabalho e pouco contato com a família, na época em que os episódios começaram.
“Eu não saía para me distrair e fui acumulando o estresse. Sempre planejava fazer algum passeio, mas nunca ia e era sempre adiado. Então penso que foi o excesso de trabalho e deixei a rotina tomar conta da minha vida. Somou-se a isso o fato de a cultura do Japão ser muito diferente do Brasil e eu sofri discriminação por ser estrangeira. Isto fez eu me sentir inferior e sem identidade”, contou.
A primeiro crise aconteceu em um dia comum há 10 anos, quando a brasileira tinha um compromisso de buscar alguém na fábrica. “Eu comecei a sentir falta de ar, o coração acelerado, dor no estômago e tremedeiras. Achei que estava tendo um infarto ou algo muito grave”, relembrou.
No mesmo dia, Cristiane foi ao hospital, relatou os sintomas, foi atendida e tomou soro. Mas ela conta que não parava de tremer e vomitar e acabou voltando para a casa neste estado.
“Depois de vários dias sem conseguir me alimentar o médico sugeriu que o meu problema fosse psicológico e me disse para ir ao psiquiatra. Eu fiquei brava com ele, nunca pensei que esses sintomas podiam ter relação com um problema psicológico, mas fui mesmo assim e descobri a síndrome”, explicou.
Desde então, a brasileira iniciou tratamento com medicamentos que toma até hoje, mas em baixa quantidade e só no momento da crise. No dia a dia, tem feito esforços para controlar as crises e faz consulta mensalmente. Como já está acostumada, ela conta que consegue lidar melhor com o problema.
“Hoje quando vem a crise eu já sei que não vou morrer e aprendi a conviver mesmo não sendo fácil. Tem vezes que dá uma vez por mês e tem vezes que acontecem várias crises no mesmo dia. Mas se comparar com antes estou bem melhor, antes eu vivia dopada”, conta.
Excesso de trabalho e a vida familiar
O excesso de trabalho, um problema típico do sistema do Japão, parece estar mesmo relacionado com os casos de ansiedade e pânico. A psicóloga Ketelen Tanaka, que é criadora do projeto Florescer e vive atualmente na província de Kagawa, conta que há um grande interesse pela terapia.
“Há um número crescente de procura devido aos quadros ansiosos, incluindo o transtorno do pânico. Um ponto em comum que chama minha atenção é que na maioria dos casos há excesso de trabalho, turnos alterados, conflitos interpessoais, especialmente no ambiente de trabalho e pouco tempo para descanso”, relatou.
Ketelen atende brasileiros em todo o Japão via online e tem se deparado com a questão do medo que os pacientes sentem de perder o controle de si mesmos, o sono irregular e outras questões que somatizam no transtorno.
“A rotina exaustiva de trabalho aqui no Japão, com carga horária muito alta e turnos alternados (chamado nikotai) são fatores que podem desencadear a condição. Esse sistema do “nikotai” deixa a pessoa com o sono irregular e é comum se sentir esgotado física e emocionalmente. Há cobranças, conflitos no trabalho, medo da situação financeira e pouco tempo para descansar”, assinalou.
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Em Tokoname, na província de Aichi, outra brasileira mostra o peso das palavras da psicóloga. Gabriela Akemy tem 27 anos e sofre com a síndrome do pânico desde a adolescência. Aos 18 anos, engravidou da primeira filha e passou um momento difícil com as crises durante a gestação.
“Eu morava perto da base aérea e comecei a sentir muito medo de ficar sozinha. Eu sentia uma sensação de morte o tempo todo. Meu marido saía para trabalhar e a minha mãe precisava vir para a minha casa ficar comigo e então busquei ajuda e tive o diagnóstico de síndrome do pânico e depressão”, revelou.
Ela chegou a se recuperar nos anos seguintes, mas o trabalho acabou desencadeando os ataques de pânico mais uma vez. “Depois eu me mudei de cidade e voltei a trabalhar. Eu cuidava das minhas filhas de dia e trabalhava à noite, não descansava direito e com isso acabei ficando doente. Desmaiei no serviço um dia e foi ao médico, descobri que estava com uma anemia já em estado grave e se não tratasse com urgência poderia morrer a qualquer momento”, relembrou.
O choque da informação piorou as crises de ansiedade. A brasileira conta que passou a ter um episódio atrás do outro e foi ao médico achando que poderia ser infarto, devido aos sintomas que afetavam o coração, como palpitações e taquicardia.
“Foi um ano em que passei fazendo todos os tipos de exames possíveis, de coração e até de câncer, fiz de tudo. Procurei vários médicos e nada melhorava as dores, até que um médico percebeu que eram sintomas do pânico mesmo. No meu caso, sinto os braços formigarem e vou perdendo as forças dos braços e pernas. Meu corpo paralisa, tenho palpitações e choro muito com a sensação de morte”, revelou.
Mas a situação também tem sido contornada e Gabriela passou a ter bons resultados com os tratamentos terapêuticos. “Hoje eu faço acompanhamento com psiquiatra e terapia com psicóloga. Esta foi a melhor escolha que fiz. Hoje em dia eu me sinto bem melhor, mas as crises sempre voltam se tem algum gatilho. A terapia está dando muito resultado, consigo lidar muito melhor do que alguns anos atrás porque agora percebo os sinais que o meu corpo dá”, contou.
O poder das terapias e estilo de vida saudável
A busca por saúde mental é uma necessidade para quem vive os efeitos de uma sociedade acelerada e uma rotina de trabalho intensa, muitas vezes com relações conturbadas entre colegas e chefes.
As consultas com psicólogos trazem resultados importantes para quem tem que lidar com crises de ansiedade e pânico, além de outros transtornos mentais. Mas no campo das terapias, há muitas opções para aliviar as tensões, soltar as emoções acumuladas e restaurar o equilíbrio mental.
Evelin Bolzani é massoterapeuta, acupunturista, mestre em reiki, facilitadora em barras de access e em terapias holísticas e multidimensionais. A terapeuta vive em Hamamatsu (Shizuoka) e faz atendimentos online e presenciais e, entre seus pacientes, há muitos que sofrem da síndrome do pânico. “Os pacientes se queixam de muita angústia, sentimentos de pavor, medos conhecidos e desconhecidos, pensamentos repetitivos e questões físicas como falta de ar”, explica.
Nestes casos, Evelin costuma fazer um tratamento com biomagnetismo e bioenergia que, sengudo ela, tem dado resultados fantásticos para os pacientes.
“Todas as terapias que trabalhamos dão muito resultado positivo. O tratamento de biomagnetismo com LIEM (Liberação Intensa Emocional Magnética) é uma técnica que libera emoções aprisionadas no interior energético do ser, aliviando sintomas mentais, físicos e emocionais. Essa técnica traz resultados fantásticos”, garante.
Além de terapias com profissionais, quem sofre com a síndrome do pânico deve procurar uma rotina mais balanceada e saudável. Mudanças na alimentação e no estilo de vida também podem ajudar a combater os sintomas emocionais, físicos e psicológicos.
“É ideal ainda buscar qualidade de vida com atividade física e meditação, contato com a natureza e alimentação orgânica consciente, chás, óleos essenciais e tratamentos terapêuticos que trabalhem o equilíbrio do corpo, mente e espírito”, sugeriu Evelin.
A psicóloga Ketelen Tanaka também é a favor de que os pacientes repensem seus estilos de vida em prol da saúde mental, contribuindo com a melhora do quadro e a promoção do bem-estar diário.
“O acompanhamento psicológico ajuda a aprender como o corpo reage às situações estressantes que desencadeiam a crise. É possível trabalhar nas causas, reconstrução de hábitos, pensamentos e comportamentos. Além disso, precisamos do combo do equilíbrio: alimentação, higiene do sono e atividade física. Meditação, ioga, leitura, atividades de lazer, tudo isto ajuda a desacelerar a mente”, aconselhou.
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