Neste mês, uma brasileira grávida que mora em Gifu foi surpreendida ao ver uma lacraia subindo na cama onde estava o marido e o filho de 4 anos

 

 

 

 

Texto: Ana Paula Ramos/Record TV Japan
Foto: AdobeStock

 

 

 

Muitos brasileiros que moram no Japão já tiveram alguma experiência com lacraias, também conhecidas como centopeias. Os quilópodes, caracterizados pelo corpo alongado e uma série de patas, são venenosos, se alimentam de insetos vivos e costumam entrar nas residências atrás de presas.

 

No Brasil, uma lacraia protagonizou uma tragédia no último dia 12. O menino Brayan Gabriel Duarte dos Santos, de 2 anos, morreu na cidade de Salete, em Santa Catarina, após ter sido mordido no pescoço.

 

Os jornais locais noticiaram que o garoto estava com a mãe, que não viu o momento em que o animal atacou. Ele teve inchaço no pescoço e febre alta como sintomas iniciais. Foi levado ao hospital, mas não resistiu depois que o veneno se espalhou pelo corpo e atingiu os órgãos.

 

O caso serviu de alerta sobre o perigo das lacraias, que também são presença constante nas casas no Japão. Dias antes da tragédia com o menino Brayan, uma brasileira que mora em Seki (Gifu), passou por uma situação aterrorizante ao encontrar uma lacraia subindo na cama.

 

Bruna Miyata, de 24 anos, vive com o marido, o filho de 4 anos e está grávida do segundo bebê. Ela conta que o caso aconteceu por volta da meia-noite do dia 6 de outubro e ficou muito assustada.

 

“O meu marido estava deitado com os pés encolhidos e eu tinha acabado de tomar banho quando sentei na cama do lado dele para trocar o meu filho. De repente eu vi algo preto subindo na cama rapidamente. Dei um grito assustada e nos afastamos”, relatou.

 

Ela conta que foi pegar algo para matar a lacraia, mas não conseguiu.

 

“É difícil de matar. Então o meu marido pegou um hashi (palitinhos) e jogou do lado de fora do apartamento, no meio do mato. Eu não sabia que era venenosa”, diz.

 

Bruna contou o caso nas redes sociais e o relato atraiu diversos comentários de outros brasileiros que já passaram por situações parecidas. Há pessoas que foram picadas, ficaram com dores no corpo, febre e inchaço e outros tiveram que correr para proteger o filho.

 

Este é o caso de Romy Naomi Hayashihara, de 39 anos. Mãe de Luana, que hoje tem 17 anos, Romy possui uma história inesquecível com uma lacraia em 2005, quando a filha era um bebê com menos de um ano. Na época, a brasileira que hoje mora em Iwakura (Aichi), morava em Handa, na mesma província.

 

Ela conta que estava sozinha em casa de licença-maternidade com a filha e mexia no computador enquanto a menina assistia a um desenho animado no tapete da sala.

 

A lacraia que subiu na cama da brasileira Bruna Miyata no início do mês – Foto: Arquivo pessoal/Cedida

“Eu estava conversando com o pessoal do Brasil no antigo MSN e de repente vi um vulto passando perto do meu pé e avançando nela. Na hora eu pensei que fosse um rato, parecia ser um bicho bem grande. O meu impulso de mãe foi pegá-la pelo colarinho do macacão jeans que ela vestia. Eu segurei nas duas alças e joguei para cima do sofá”, contou.

 

O impulso de mãe fez com que Romy salvasse a filha pouco antes do ataque.

 

“Quando eu olhei para o chão, vi aquele bicho enorme e cheio de patas. Eu não tinha ideia do que era aquilo, nunca tinha visto na vida. Liguei para o meu marido na época e contei como era o bicho e ele disse que devia ser uma lacraia. Fui pesquisar na internet e era mesmo”, diz.

 

Na pressa de acudir a filha que começou a chorar depois de ser jogada no sofá, Romy acabou perdendo a lacraia de vista e teve uma noite difícil que nunca esqueceu.

 

“Fiquei com muito medo, peguei a minha filha e fui para o quarto. Não consegui dormir. Eu desencostei a cama da parede e fiz tudo o que podia para esse bicho não subir na gente. No dia seguinte compramos um pó de veneno para lacraia e não apareceu mais”, relembra.

 

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O portal informativo da Earth Corporation, empresa japonesa de produtos farmacêuticos e pesticidas, explica que as lacraias costumam atacar pelo fato de serem quase cegas.

 

“Nós criamos as lacraias em laboratório e as alimentamos com baratas vivas. Por serem animais com uma péssima visão, não conseguem reconhecer se o que está próximo é ou não uma presa. Então elas atacam quando percebem um movimento e por isso são tão perigosas para bebês e crianças”, diz o alerta.

 

Cuidados com a mordida

 

Romy salvou a filha por pouco, mas outra brasileira acabou correndo para o hospital depois que a filha foi mordida por uma lacraia. Quem conta essa história é Cynthia Osawa, que mora na cidade de Toyota, também em Aichi.

 

A filha Bruna, que hoje tem 24 anos, foi atacada por uma lacraia em casa, há mais de 10 anos. Na época, a família morava em um apartamento na mesma cidade.

 

Romy e a filha Luana, que quase foi atacada por uma lacraia

“Nós morávamos no quinto andar e dormíamos no chão. Ela apareceu de noite, na hora que íamos dormir. Minha filha tirou a lacraia e acho que foi nesse momento que ela mordeu. Meu marido espremeu o machucado e acho que o veneno saiu, mas nós corremos para o hospital”, disse.

 

Por sorte, a menina não sofreu nenhuma consequência de saúde por causa do veneno, apenas um inchaço na pele. “Depois de dois anos nós nos mudamos e nunca mais tivemos problemas com lacraias”, diz.

 

A empresa de dedetização Kumamoto Shiroari Kujo também fez um alerta sobre os quilópodes e explicou que são animais com maxilares fortes e afiados, que mordem suas presas e injetam o veneno. Por isto, o termo correto é “morder” e não “picar”.

 

A mordida pode provocar inchaço, febre, náuseas e mal-estar e é importante ir ao hospital. “O veneno das lacraias tem substâncias parecidas com o veneno das abelhas e pode provocar um choque anafilático”, diz o alerta da empresa.

 

Se for mordido, não é recomendado esfriar o ferimento e nem chupar a ferida. Se colocar gelo, a dor pode aumentar e há casos em que o paciente sofre uma convulsão. Tentar remover o veneno com a boca faz com que a substância tóxica entre em contato com os lábios, provocando inchaço e os mesmos sintomas.

 

O procedimento correto é lavar o ferimento com água quente assim que sofrer a mordida. O veneno é sensível ao calor e pode ter suas propriedades tóxicas desativadas em temperaturas de 43° C a 46° C, que não chegam a queimar a pele.

 

“Deixe a água escorrer pelo ferimento nessa temperatura por cinco minutos e assim é possível prevenir dor e inchaço no lugar da mordida. Se tiver qualquer outro sintoma além da dor no ponto da ferida, vá para um hospital. Principalmente no caso de crianças e idosos, que tem a imunidade mais fraca”, diz as instruções da Kumamoto Shiroari Kujo.

 

Hábitos das lacraias

 

As lacraias venenosas responsáveis pelos ataques nas residências são da espécie Scolopendra e se caracterizam pelo corpo escuro, as patas amarelas e tonalidades vermelhas.

 

As centopeias vivem entre 6 e 7 anos e possuem hábitos bastante específicos. Do início da primavera ao início do verão, se abrigam embaixo de pedras e folhas. Elas colocam os ovos entre os meses de maio e junho e aparecem com frequência até o fim do outono.

 

Entre os meses de setembro e outubro, os filhotes crescem e se tornam ativos. É nesta época que há mais relatos de lacraias que entram nas residências, são encontradas dentro de sapatos ou surpreendem pessoas na hora de dormir.

 

Como entram nas casas em busca de alimento, principalmente baratas, acabar com focos de insetos na residência é um meio de tornar o espaço menos atrativo para elas.

 

Quando os filhotes nascem, a fêmea busca comida para a cria durante dois meses, até que esteja apto a se alimentar por conta própria. Os filhotes se separam da mãe neste período e se tornam adultos por completo após três anos de vida.

 

Nos meses de inverno, as lacraias hibernam e neste período é raro se deparar com esses animais. No entanto, quando a primavera se inicia, os riscos de aparecerem nas casas aumentam.