Agência de Cooperação Internacional do Japão cria órgão para orientar trabalhadores estrangeiros sobre direitos e o dia a dia

 

Texto: Ewerthon Tobace/Record TV Japan
Foto: Sabja e conselho de cidadãos do Consulado-Geral do Brasil em Tóquio vem distribuindo cestas básicas para quem precisa /Divulgação/Sabja

 

O telefone de Erika Tamura não para de tocar o dia todo. Mal se senta para tomar uma xícara de café e mais um pedido de ajuda chega pelo celular. “Depois que começou a pandemia, aumentou em três vezes o número de chamadas telefônicas”, conta a coordenadora da organização sem fins lucrativos Sabja – Serviço de Assistência aos Brasileiros no Japão, responsável pela triagem das ligações.

 

“A maioria precisa de atendimento psicológico”, diz Erika. Ela explica que a demanda cresceu principalmente pela crise econômica, que fez muitos perdessem o emprego ou tivessem a carga horária reduzida, o que gera impacto direto na renda mensal. “O poder aquisitivo do brasileiro ficou menor e, pelos atendimentos, percebemos que as pessoas ficaram ansiosas e desesperadas com o acúmulo de contas para pagar”, detalha.

 

A consultora Vanessa Handa, que atende no Consulado-Geral do Brasil em Hamamatsu, na província de Shizuoka, também viu o volume de trabalho aumentar com a pandemia. “Muitas pessoas ficaram paradas e não receberam salário. As empreiteiras não demitiram, mas diminuíram a carga horária”, conta. 

 

Por lei, essas empresas deveriam pagar ao menos 60% do salário. “A lei existe, mas há uma grande diferença no Japão entre obrigação e cooperação; e muitas empresas acabaram achando brechas para se livrar da culpa”, lamenta Vanessa, que presta assistência aos brasileiros e outros estrangeiros na área trabalhista, previndenciária e na gestão de pequenas empresas.

 

Foto: Divulgação/Sabja

Erika conta ainda que um grande número de estudantes bolsistas e trabalhadores qualificados também entraram em contato para pedir ajuda. “Fornecemos cestas básicas para essas pessoas”, conta. Outros grupos, organizações e os conselhos de cidadãos dos três consulados brasileiros no Japão vem arrecadando mantimentos e distribuindo para quem precisa. “Conseguimos também incluir muitas famílias no Banco de Alimentos do Japão”, ressalta a coordenadora do Sabja. “Existem vários tipos de ajuda do governo japonês, mas os brasileiros não têm acesso a essas informações”, lamenta.

 

Vanessa concorda. Ela diz que um problema comum nos anos 90 voltou a acontecer na comunidade. Brasileiros vem ao Japão com passagem financiada pela empreiteira e promessa de um emprego com muitas horas extras. “Quando chegam aqui, a realidade é outra e o salário não chega ao que se esperava. Acabam ficando presos nas mãos dos empregadores até quitarem a dívida”, relata. O pior, segundo a consultora, é quando são famílias e apenas um consegue trabalho “Acabam passando necessidade, pois a maior parte da renda é para pagar o financiamento”, relata. Com a pandemia, a consultora diz que os casos diminuíram, já que os voos foram cancelados. “Mas o problema está aí e, assim que normalizar a situação, esses casos devem aumentar novamente.”

 

Trabalho 

 

O Japão criou um novo sistema de vistos em 1º de abril de 2019, em um esforço para atrair mais trabalhadores não-qualificados do exterior, marcando uma grande mudança de política em relação às regras de imigração tradicionalmente rígidas.

 

O número de estrangeiros residentes no Japão totalizou 1.66 milhões em 2019, um aumento de 13,6% em relação ao ano anterior, mas abaixo do que o governo esperava no primeiro ano, de acordo com a agência de imigração.

 

Ainda assim, o governo japonês tem enfrentado críticas sobre o tratamento dispensado a estrangeiros que vêm de países em desenvolvimento para servir, principalmente, como estagiários técnicos, inclusive com violações de direitos humanos.

 

Não é novidade que milhares destes trabalhadores tenham “fugido” do programa, segundo o Ministério da Justiça, provavelmente devido aos baixos salários e longas jornadas de trabalho.

 

Mais ajuda

 

“Não é somente a comunidade brasileira que sofre com a falta de uma política imigratória mais inclusiva por parte do Japão”, opina Erika. Desde que foi criada a categoria de visto para trabalhadores estrangeiros e estagiários técnicos, viu-se um aumento do abuso de trabalhadores asiáticos e até casos de escravidão moderna. “Esses trabalhadores vêm com uma promessa, assumem dívidas com as contratantes, que arcam com passagem e moradia, e assim acabam sendo explorados”, conta Vanessa Handa.

 

Por causa do aumento de denúncias nos últimos anos, a Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica), anunciou nesta semana que lançará uma organização, agora em 16 de novembro, para fornecer apoio abrangente aos trabalhadores estrangeiros no Japão e, assim, melhorar o ambiente de trabalho e de vida.

 

A organização será criada em conjunto com a Aliança Global pela Cadeia de Fornecimento Sustentável, um órgão não-governamental que se concentra em questões de direitos humanos. O trabalho será focado principalmente nas dificuldades enfrentadas por trabalhadores estrangeiros.

 

O órgão, que ganhou o pomposo nome de “Plataforma Japonesa para Trabalhadores Migrantes para uma Sociedade Responsável e Inclusiva”, buscará tornar o Japão uma escolha mais atraente para os estrangeiros em meio à aguda escassez de mão de obra, fortalecendo a comunicação, propondo iniciativas de reforma e transmitindo informações dentro e fora do Japão.

 

Toyota Motor Corp. e Ajinomoto Co. estão entre as empresas que também aderiram ao projeto.

 

Segundo reportagem da agência de notícias Kyodo, a JICA espera que a nova organização ajude a criar um modelo que não apenas atraia mais mão de obra estrangeira, mas também contribua para o desenvolvimento dos países de onde vêm esses trabalhadores.

 

Mais da metade dos cerca de 1,66 milhão de trabalhadores estrangeiros residentes no Japão vêm de países em desenvolvimento. A nova organização quer garantir que esses trabalhadores possam colocar em prática as habilidades aprendidas quando voltarem para casa, no futuro. “Se os trabalhadores que vierem estiverem satisfeitos (com sua experiência), eles vão querer voltar ao Japão, e se ganharmos uma grande reputação, podemos esperar um grande aumento de trabalhadores, o que também beneficiará o Japão”, disse Kenichi Shishido, da JICA, durante coletiva de imprensa.

 

 

Onde pedir ajuda

 

Sabja
Telefone: 050-6861-6400
E-mail: nposabja@gmail.com

 

Consulado-Geral do Brasil em Hamamatsu
Atendimento: segunda, terça e quarta-feira
Telefone: (053) 450-8130
E-mail: empreender.hamamatsu@itamaraty.gov.br

 

Centro de Ajuda Universal
Telefone: (053) 413-1661