O percentual de jovens que não fazem 60 minutos de atividade física em nenhum dia da semana foi de 43,4%; antes da pandemia, o índice era de 20,9%

 

Texto: Redação/Record TV Japan
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Sem poder sair de casa para ver os amigos, Camila Silva passa os dias na frente do computador, na cama ou vendo tevê. O único momento mais “livre” é quando vai para a escola. Mas lá, há muitas restrições de contato, obrigatoriedade do uso da máscara e atividades de recreação reduzidas. “Tento ler um livro, mas não consigo me focar. Tenho medo de me contaminar e trazer o vírus para dentro de casa e infectar meus pais”, conta a jovem. “Eles precisam trabalhar e me orientam o tempo todo para tomar cuidado”, emenda.

 

Camila não é a única a sofrer este turbilhão de emoções. Em um estudo coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) sobre a pandemia de Covid-19, jovens brasileiros relataram mudanças de rotina, alterações de humor, piora na saúde e adoção de hábitos alimentares não saudáveis. Entre diversas informações, a pesquisa revela que 48,7% dos adolescentes têm sentido preocupação, nervosismo ou mau humor, na maioria das vezes ou sempre.

 

Considerando apenas as meninas, o percentual sobe para 61,6%. No recorte por idade, o índice é maior entre adolescentes mais velhos, de 16 e 17 anos. Nessa faixa etária, tais sentimentos foram relatados por 55,3%, percentual superior aos 45,5% registrados no grupo entre 12 e 15 anos.

 

Intitulado ConVid Adolescentes – Pesquisa de Comportamentos, o estudo coordenado pela Fiocruz foi realizado em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Foram entrevistados 9.470 jovens de todo o Brasil na faixa de 12 a 17 anos. Os questionários foram respondidos de forma online entre junho e setembro. 

 

O aumento dos relatos de sedentarismo é outro dado que consta do estudo. O percentual de jovens que não fazem 60 minutos de atividade física em nenhum dia da semana foi de 43,4%. Antes da pandemia, o índice era de 20,9%. Os pesquisadores chamam a atenção para esta mudança, uma vez que jovens costumam praticar esportes, aulas de dança e outras atividades.

 

O tempo de uso de equipamentos eletrônicos como computador, tablet e celular aumentou. Entre os adolescentes de 16 e 17 anos, 77% afirmaram ficar em frente a esses aparelhos mais de quatro horas por dia, sem contar o período em que eventualmente estão tendo aulas online.

 

O consumo de alimentos não saudáveis em dois dias ou mais por semana aumentou. Pratos congelados, chocolates e doces estão sendo 4% mais consumidos. De acordo com a pesquisa, 36% dos adolescentes entre 12 e 17 anos relataram queda na qualidade do sono durante a pandemia. A piora da saúde de forma geral foi apontada por 30% dos jovens.

 

Problemas relacionados com as aulas online também foram diagnosticados: 59% afirmaram ter dificuldades para se concentrar nas aulas a distância e 38,3% se queixaram da falta de interação com os professores. Em relação ao entendimento do conteúdo ministrado, 47,8% dos adolescentes relataram estar entendendo pouco e 15,8% disseram não estar entendendo nada.

 

A grande maioria dos adolescentes afirmou ter aderido a medidas de restrição social. Esse grupo reuniu 71,5% dos entrevistados, e a restrição total foi relatada por 25,9%, enquanto 45,6% disseram adotar uma restrição intensa, em que só saem para supermercados, farmácias ou casa de familiares.

 

Pesquisa

 

A preocupação dos jovens tem um motivo. Desde o final do ano passado, o número de casos vem aumentando. E, para piorar a situação, pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) observaram que a primeira exposição ao coronavírus pode não produzir memória imune em casos brandos, o que significa que uma pessoa que teve Covid-19 pode ser reinfectada pelo vírus. 

 

Para comprovar a tese, pesquisadores fizeram o sequenciamento dos genótipos do novo coronavírus de quatro indivíduos assintomáticos. A pesquisa foi coordenada pelo virologista Thiago Moreno, pesquisador do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde da Fiocruz (CDTS/Fiocruz). 

 

Quatro pessoas assintomáticas foram acompanhadas semanalmente pelos pesquisadores a partir do início da pandemia, em março, com testes sorológicos e RT-PCR (exame considerado o padrão ouro no diagnóstico da Covid-19) nos indivíduos acompanhados. Todos testaram positivo para Covid-19.

 

No sequenciamento dos genomas, os pesquisadores confirmaram que uma pessoa contraiu o vírus associado a um genoma importado para o país e outra apresentou uma estrutura viral associada ao genoma que já circulava no Rio de Janeiro.

 

Ambiente familiar

 

No final de maio, uma das pessoas acompanhadas procurou o grupo de pesquisa dizendo estar com sinais e sintomas mais fortes de Covid-19, como febre e perda de paladar e olfato, informou Thiago Moreno.

 

“Quando fizemos o RT-PCR mais uma vez, os quatro indivíduos testaram positivo. O que observamos foi uma reinfecção dentro do ambiente familiar. Contudo, a pessoa que apresentou em março o genótipo associado a casos importados no Brasil, agora estava infectada por uma outra cepa.” 

 

Também foi observado, no sequenciamento, que “o outro indivíduo, que tinha sido infectado com o genótipo que circulava no Rio, continuava com o mesmo genótipo, mas tinha um acúmulo de mutações que permitiu a interpretação de que era uma reinfecção e não uma persistência de infecção”, esclareceu o pesquisador.

 

Moreno avaliou que o trabalho reforçou a noção de que a reinfecção pelo novo coronavírus é possível, e que é algo comum entre vírus respiratórios, o que quer dizer que a primeira exposição ao vírus não é formadora de memória imune. “Casos assintomáticos ou muito brandos, se forem reexpostos ao vírus, poderão ter novamente uma infecção. Desta vez, pode ser que o quadro se agrave e que essa infecção seja mais severa do que a primeira, como demonstrado na pesquisa. Por esse motivo fez o alerta à população sobre a imunidade para o coronavírus. Em alguns casos, as respostas imunes podem ser fortes num primeiro momento, mas não significa que elas sejam duradouras”, disse o virologista da Fiocruz.

 

O resultado da pesquisa Viral Genetic Evidence and Host Immune Response of a Small Cluster of Individuals with Two Episodes of Sars-Cov-2 Infection foi publicado no periódico ‘Social Science Research Network’. [Com Agência Brasil]