Primeiro-ministro japonês pediu para que a população evite as confraternizações de fim de ano para evitar mais contaminações de Covid-19, em meio aos crescentes recordes de casos no país

 

Texto: Redação/Record TV Japan
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Pela tevê, com um ar preocupado, o primeiro-ministro do Japão, Yoshihide Suga, se dirige a jornalistas e faz um apelo: “As infecções não estão diminuindo e, se continuarmos assim, não seremos capazes de evitar uma maior disseminação do vírus”. O líder japonês quer que as pessoas evitem se aglomerar neste fim de ano. Ele pediu para que a população fique em casa e cancele as reuniões sociais e festejos de virada de ano, numa tentativa de conter a rápida propagação da Sars-Cov-2. Nas últimas semanas, dia após dia, as autoridades divulgam recordes de novos casos no país, um dos poucos que ainda vinha conseguindo controlar a doença. “Quero que vocês tenham um ano-novo tranquilo”, reforça Suga.

 

A preocupação do premiê tem um motivo a mais. Nesta sexta-feira foram confirmados os cinco primeiros casos da nova variante do coronavírus, que se dissemina muito mais rapidamente e que obrigou o Reino Unido a decretar confinamento completo da população. Autoridades de saúde britânicas disseram que a nova cepa, detectada pela primeira vez em setembro, pode ser até 70% mais transmissível, mas não há evidências de que seja mais letal ou reduza a eficácia das vacinas. Casos já foram confirmados na Austrália, Dinamarca, Itália, Holanda e África do Sul, de acordo com relatos da mídia. Os cinco infectados que chegaram ao Japão vieram de Londres e estão isolados. Por isto, Suga explicou também que o governo vai implantar fortes medidas de quarentena nos aeroportos e observar mais rigidamente os viajantes.

 

Os cinco infectados – quatro homens e uma mulher e todos com menos de 70 anos – estão agora hospedados em hotéis fornecidos pelas autoridades depois que a quarentena do aeroporto confirmou as infecções. De acordo com as autoridades, nenhum deles teve contato próximo com outras pessoas desde o retorno ao Japão. O Ministério do Trabalho, Saúde e Bem-Estar não divulgou muitos detalhes sobre os pacientes. Mas sabe-se também que pelo menos uma criança com menos de 10 anos está entre as infectadas e quatro deles são assintomáticos. Dois deles chegaram ao aeroporto de Haneda, em Tóquio, enquanto os outros pousaram no aeroporto de Kansai, na província de Osaka. “Faremos tudo o que pudermos para eliminar as chances de (a nova cepa) se espalhar no Japão”, prometeu o ministro Norihisa Tamura.

 

“Se deixarmos o vírus continuar circulando livremente, damos muita chance para ele se adaptar melhor à transmissão nos humanos”, disse à BBC News Brasil Tulio de Oliveira, o brasileiro por trás da descoberta de uma nova mutação “mais transmissível” do coronavírus que vem causando preocupação ao redor do mundo. Oliveira é diretor do laboratório Krisp, na escola de Medicina Nelson Mandela, na Universidade KwaZulu-Natal, em Durban, na África do Sul, onde vive desde 1997. Ele chefiou a equipe que descobriu a nova variante do coronavirus no país e compartilhou os dados com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o que, por sua vez, permitiu ao Reino Unido descobrir a sua própria variante.

 

Cooperação da população

 

O Japão não celebra o Natal, mas o Ano-Novo é um feriado nacional prolongado e muito importante para os japoneses. Nesta época, é comum as pessoas viajarem para suas cidades natais e passar o período com a família ou amigos. Por isto, o líder do grupo de especialistas que assessora o governo japonês, Shigeru Omi, reforçou o pedido do primeiro-ministro para que as pessoas fiquem em casa. Ele disse que a cooperação de todos é fundamental para controlar a crise de saúde. “Se não reduzirmos as infecções agora, uma vez que aumentem novamente após o período de ano-novo, não será fácil mudar a tendência”, disse ele. “Isso levaria tempo e provavelmente seria impossível de controlar em um período de semanas”, alertou. O especialista explicou que o meio mais rápido e fácil de contaminação é durante uma refeição compartilhada, principalmente se o grupo for grande. 

 

Embora o Japão tenha conseguido controlar de forma eficiente a disseminação em massa do coronavírus, nas últimas semanas o país vem sofrendo um revés. O número de novos casos diários ultrapassou 3.000 pela primeira vez neste mês e a capital japonesa chegou a registrar 884 infecções na sexta-feira (25), bem próxima do recorde de 888 do dia anterior. O aumento do número de casos tem um reflexo direto nos hospitais, que estão sofrendo pressão. Por isso, cinco grupos nacionais de médicos e outros profissionais da área médica fizeram um apelo de emergência a Suga. Eles querem medidas antipandêmicas mais fortes e apoio para o setor médico. O primeiro-ministro já anunciou um pacote extra de 270 bilhões de ienes para hospitais que tratam pacientes com Covid-19. 

 

O Japão, com uma população de 126 milhões, fechou acordos para comprar 290 milhões de doses de vacina da Pfizer Inc, AstraZeneca Plc e Moderna Inc, ou o suficiente para 145 milhões de pessoas. Segundo o plano do governo, pessoas com mais de 65 anos devem ter prioridade para a vacinação, bem como profissionais de saúde da linha de frente e pessoas com problemas de saúde pré-existentes, como doenças cardíacas crônicas, doenças respiratórias crônicas e doenças renais crônicas, entre outras. Segundo as projeções, um total de 36 milhões de idosos e 8,2 milhões de pessoas com problemas médicos seriam os primeiros a receber as vacinas.

 

A nova cepa

 

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A situação ficou mais complicada com a descoberta desta nova cepa da Sars-Cov-2. Autoridades da União Europeia (UE) estão discutindo uma resposta conjunta a essa nova variante que é mais infecciosa. Mais de 40 países, incluindo o Brasil, já fecharam suas fronteiras com o Reino Unido até o momento. Um aumento de casos de coronavírus no sudeste e leste inglês, incluindo Londres, está ligado à disseminação desta nova variante — embora ela já seja encontrada em todo o país, de acordo com o governo britânico. Isso fez com que o primeiro-ministro Boris Johnson anunciasse medidas mais rígidas de isolamento para 20 milhões de pessoas na Inglaterra e em todo o País de Gales.

 

A nova variante, surgida após mutações, se tornou a forma mais comum do vírus em algumas partes da Inglaterra em questão de meses. O governo britânico diz que há motivos para acreditar que ela seja bem mais contaminante, possivelmente 70% mais transmissível. Os estudos sobre essa nova forma do vírus ainda estão em estágio inicial. Mas preocupam os especialistas por três motivos: esse coronavírus está substituindo rapidamente outras versões do vírus; possui mutações que afetam partes do vírus que são provavelmente importantes; e já se verificou em laboratório que algumas dessas mutações podem aumentar a capacidade do vírus de infectar células do corpo.

 

Mutações são comuns nos virus. O da influenza tem novas cepas todos os anos. Por isso, a necessidade de se vacinar a cada nova temporada. No caso da Sars-Cov-2, o vírus que foi detectado pela primeira vez em Wuhan, China, não é o mesmo que existe hoje nos quatro cantos do mundo. A mutação D614G surgiu na Europa em fevereiro e se tornou a forma globalmente dominante do vírus. Outra, chamada A222V, se espalhou pela Europa e estava ligada às férias de verão na Espanha.

 

O que sabemos sobre as novas mutações? Segundo uma reportagem publicada pela BBC News Brasil, uma análise inicial da nova variante foi publicada e identifica 17 alterações potencialmente importantes. Houve mudanças na proteína spike — que é a “chave” que o vírus usa para abrir a porta de entrada nas células do nosso corpo e sequestrá-las. A mutação N501 altera a parte mais importante do spike, conhecida como “domínio de ligação ao receptor”. É aqui que o spike faz o primeiro contato com a superfície das células do nosso corpo. Quaisquer alterações que tornem mais fácil a entrada do vírus provavelmente serão uma vantagem para o patógeno. 

 

A preocupação, de acordo com o texto publicado pela BBC, era que os anticorpos do sangue daqueles que sobreviveram ao novo coronavírus fossem menos eficazes na defesa contra a nova variante do vírus. Mais uma vez, serão necessários mais estudos de laboratório para realmente entender o que está acontecendo. O trabalho de Ravi Gupta, professor da Universidade de Cambridge, sugeriu em laboratório que essa mutação aumenta em duas vezes a capacidade do vírus de infectar células. “Estamos preocupados, a maioria dos cientistas está preocupada”, diz Gupta.

 

Mas, o que todos querem saber é se as vacinas funcionarão contra a nova variante? Os especialistas acreditam que sim, pelo menos por enquanto. Mutações na proteína spike levantam perguntas porque as três principais vacinas — Pfizer, Moderna e Oxford — treinam o sistema imunológico para atacar a proteína spike. No entanto, o corpo aprende a atacar várias partes dessa proteína. É por isso que as autoridades de saúde continuam convencidas de que a vacina funcionará contra essa nova variante.

 

Enquanto os resultados dos estudos não saem, o mais prudente é seguir o conselho do primeiro-ministro Yoshihide Suga e ficar em casa e evitar as aglomerações. É preciso lembrar que muitos são assintomáticos e muitas vezes não se dão conta ou não sabem que estão espalhando o vírus. Se todos colaborarem, a pandemia estará sob controle em breve e a rotina será retomada.