Câmera Record recebe prêmio por documentário sobre trabalho escravo na Amazônia
Foto: Divulgação Record TV
A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) anunciou a lista de profissionais de comunicação da Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Estados Unidos, México, Nicarágua e Venezuela que venceram a premiação anual promovida pela instituição, o Prêmio de Excelência Jornalística. O Câmera Record foi o ganhador da categoria Direitos Humanos pelo documentário “Piaçaba: exploração no coração da Amazônia”, que denunciou que na atividade extrativista havia trabalhadores em condições análogas à escravidão. O trabalho, que foi o milésimo documentário do Nucleo de Reportagens especiais da Record TV, já havia sido premiado com o 34º Prêmio de Direitos Humanos de Jornalismo, na categoria Televisão.
O programa concorreu com mais de 1.200 trabalhos de jornalistas do continente americano que foram enviados à instituição e que concorreram em 14 categorias.
A cerimônia de premiação será realizada em Miami, em outubro, durante a 75ª Assembleia Geral da SIP. A escolha foi justificada pela organização “por denunciar, mediante um documentário vibrante e comovente, o horror do trabalho escravo na selva amazônica brasileira”.
Sheila Manuela Martins Fernandes, Romeu Piccoli, Rodrigo Bettio, Marcio Strumiello, Gustavo Costa, Rafael Gomide, Natália Florentino, Rafael Ramos compõem a equipe vencedora, que faz parte do Núcleo de Reportagens Especiais da Record TV, que tem Rafael Gomide como chefe de redação e Pablo Toledo como editor-chefe.
Para produzir o programa, a equipe participou de uma expedição cuidadosamente organizada e planejada em cada detalhe, que durou um mês e incluiu uma viagem de 120 horas de barco pelos rios da Amazônia . Enfrentaram muita chuva e tiveram que contar com gerador de energia elétrica portátil para recarregar as baterias dos equipamentos. Passaram noites na selva, comeram a comida dos piaçabeiros e vivenciaram a rotina deles.
“Em 25 anos de jornalismo, essa foi a reportagem-expedição mais difícil que eu fiz. Primeiro, tudo deu errado. Depois, tudo deu certo”, relata o repórter Romeu Piccoli.
“Foi o maior desafio profissional e pessoal da minha vida! Além das histórias que encontramos, manter a calma e ter paciência foram pontos fundamentais para os momentos de tensão. Certo dia, o motor do barco quebrou e tivemos que remar por 5 horas”, conta a repórter Sheila Fernandes.
Para o editor Marcio Strumiello, um dos grandes desafios da reportagem foi o de transmitir a dimensão da área onde acontece a exploração dos piaçabeiros. “Só para se ter uma ideia, o município de Barcellos, onde tudo acontece, é do tamanho da Inglaterra. É o segundo maior munícipio do Brasil”, revela.
O Documentário
Para produzir o programa, os repórteres passaram um mês na Amazônia e enfrentaram 120 horas de barco pelo Rio Negro e afluentes para desvendar um esquema de trabalho escravo no meio da floresta, realizando um registro inédito: foi a primeira vez que uma equipe de TV conseguiu chegar ao local.
Eles localizaram uma população indígena descendente da etnia Baré, que chega a viver até seis meses dentro da selva na produção extrativista da piaçaba, fibra da palmeira usada na fabricação de vassouras. Ali, eles trabalham sob condições extenuantes e com baixíssima remuneração, uma situação que o Ministério Público do Trabalho considerou como trabalho análogo à escravidão.
Os índios passam o dia inteiro dentro da floresta e carregam toras de até 90 kg por dia. Para cada quilo é pago apenas R$ 2,20. Muitos piaçabeiros, como são conhecidos, chegam a adquirir dívida com os “patrõezinhos”, gerentes da produção, porque o custo para chegar até o local e a alimentação é muito alto.
O programa revelou que famílias inteiras vivem sem acesso à escola e saúde. “Eu preferiria estar em outro lugar, em Manaus, estudando, fazendo faculdade”, desabafou a jovem Raiane de Souza Leal.
A alimentação também é precária, no geral, farinha, café, açaí e, quando há carne, esta vem da caça do dia.
Os trabalhadores ainda são expostos à doenças como chagas e malária. Sem tratamento, muitos morrem, como foi o caso do pai de Edileuza de Souza Leal. “Vendi as coisas que eu tinha pra tirar dinheiro, geladeira, televisão, acabei com tudo pra ver se eu deixava um dinheiro pra ele. Mas não teve jeito, a doença dele não tinha jeito”.
Outro problema sério é o alcoolismo. Os piaçabeiros batizaram de “choque-choque” uma bebida à base de gasolina. O consumo constante levou à morte vários trabalhadores, dentre eles o marido de dona Guiomar Brandão Pinheiro.