Especialista na bebida típica japonesa, Roberto Maxwell diz que agora é um ótimo momento para quem pensa em investir no ramo

 

Texto: Ewerthon Tobace/Record TV Japan
Fotos: Divulgação

 

O saquê, bebida fermentada típica japonesa feita a partir de arroz, água e koji (um tipo de fungo), vem conquistando mais apreciadores pelo mundo. Com teor alcoólico que varia entre 14% e 16%, ele pode ser consumido puro, em diferentes temperaturas, e cai muito bem como base para drinques e coquetéis. De acordo com especialistas no assunto, o saquê teve um crescimento de 100% no consumo em relação ao ano anterior, recuperando os patamares pré-pandemia.

 

Animada com os números, a Japan Sake and Shochu Makers Association (JSS), órgão do governo japonês que representa produtores de saquê no Japão, organizou pela segunda vez em São Paulo, ao lado da importadora Mega Sake, o Festival do Sake no Brasil, e selecionou o projeto “The Shochu Academy”, do brasileiro Roberto Maxwell, para apresentar aos brasileiros os destilados japoneses. Em formato presencial, o evento, que envolvia teoria e prática de coquetearia, teve como palcos a Japan House e o restaurante Kotori.

 

 

Fotos: Divulgação

Na programação foram realizados dez workshops gratuitos para 350 pessoas, degustações guiadas para 320 participantes, dez sessões online, o lançamento do documentário “São Paulo, Capital do Saquê” e um jantar para convidados harmonizado com saquês.

 

Um dos convidados para falar sobre o saquê foi Roberto Maxwell, brasileiro radicado no Japão e especialista no tema. Ele ainda organizou um evento e palestrou sobre outros destilados japoneses. A Record TV Japan conversou com exclusividade com ele. Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

 

Como surgiu a proposta de você dar um workshop no Brasil?

 

O projeto foi totalmente patrocinado pela JSS que é a associação dos produtores de saquê, shochu e mirin no Japão. No início de 2021, eu participei de uma formação deles voltada para profissionais estrangeiros e japoneses que moram no Japão.

A Sake & Shochu Academy é uma das formações em saquê e shochu mais disputadas do mundo e eles só abrem para quem vive fora do Japão. Em 2021, nenhum estrangeiro não residente podia entrar no país e, para não cancelar, eles flexibilizaram a regra. Fiquei muito feliz de ter sido selecionado e sou o segundo brasileiro a ter essa formação.

O primeiro é o Fabio Ota, que é um dos sommeliers de saquê mais diplomados do mundo, e foi meu primeiro professor de saquê.

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A JSS também organiza eventos anuais mundo a fora e, mais uma vez, a pandemia foi um preditivo. Então, eles abriram editais para os ex-alunos da Academia apresentarem projetos com shochu e awamori. Eu criei, então, a The Shochu Week que tinha como evento central a The Shochu Academy, dois dias experiência com shochu e awamori para profissionais da área de bares e restaurantes do Brasil. A participação foi 100% gratuita e tivemos três vezes mais inscritos que o número de vagas. Fiquei muito feliz por isso.

 

Você vem estudando o assunto há um bom tempo, certo? Como surgiu o interesse? 

 

Como guia e consultor de viagens, sempre procuro possibilidades de oferecer experiências bacanas para os meus clientes. Então, foi natural eu me aprofundar no saquê, no shochu e no awamori.

Estudava por conta até que um encontro numa sala de aeroporto mudou esse rumo. Eu estava embarcando para o Brasil e o Fabio Ota me reconheceu das redes sociais e me perguntou se eu não tinha interesse em estudar saquê. Quando eu voltei dessa viagem, já estávamos na pandemia. Retomamos o contato e fiz o primeiro curso com ele online.

Costumo dizer que me afundei no saquê durante a pandemia porque a coisa, dali, foi ficando muito séria. Eu comecei a aproveitar o tempo ocioso para estudar mais, o que culminou em mais cursos, como o da JSS e uma vivência de produção na ilha de Sado, no verão passado. Fui me maravilhando porque o saquê junta tudo que eu amo fazer e conhecer: gastronomia, história, cultura e pessoas.

 

O que você encontrou no Brasil? É um mercado em expansão? Quais as demandas por lá?

 

O saquê está, sim, em expansão no Brasil. Está vivendo uma nova fase. Anteriormente, se pensava no saquê como ingrediente para drinques, o que eu acho muito limitador, mas os mercados têm um quê de espontaneidade que a gente não tem como controlar. Mas, enfim, a saquerinha (ou caipisaquê) ficou bem popular e usa basicamente o saquê nacional como insumo.

Agora, estamos partindo para um momento em que as pessoas começam a querer conhecer o saquê mais profundamente. Daí, as importações aumentaram. Tenho dados de que o Brasil foi um dos poucos países do mundo que tiveram aumento na quantidade de importação de saquê na pandemia. E, de fato, o país é considerado um mercado potencial.

Para o shochu e o awamori, as coisas ainda estão engatinhando. Existem poucos shochus e awamori no mercado brasileiro, tem restrição de entrada para o shochu de batata doce, também. E a própria pandemia criou distúrbios nas entregas, aumentando preços. Além disso, os impostos no Brasil são altos, fazendo com que as bebidas cheguem com preços muito altos aqui.

Então, rolam vários gargalos que a gente precisa definir bem e atacar. No meu caso, o gargalo é a informação. A minha ideia, então, é sempre aproximar o público dessas bebidas, com conteúdo de qualidade.

 

Existe um grupo de profissionais da área? O saquê (nihonshu) já era conhecido há muito tempo pelo brasileiro, mas e o shochu?

 

Existem alguns grupos de profissionais aqui no Japão, em especial de saquê. Além disso, tem a ABGJ que é a Associação Brasileira de Gastronomia Japonesa e que faz também alguma conexão entre as pessoas. Acho que ainda podemos nos organizar mais. Mas as coisas estão caminhando.

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Quais os planos agora? Você se imaginava entrando nesse mercado, como “consultor”? Quando começou a estudar seus planos eram quais? 

 

Meu plano agora é seguir produzindo conteúdo e prestando consultoria. Já estou com eventos corporativos marcados, o que é uma aproximação direta com o público consumidor. Também estamos organizando alguns eventos de harmonização, aproveitando a minha passagem pelo Brasil. A ideia, também, é que consigamos tornar a Shochu Academy um evento anual. Além disso, retomo a série 3XSaquê para uma segunda temporada, com mais três histórias de sakaguras, desta vez na Região de Kansai. Sigo nesse processo de educação e difusão de informação, que é o caminho que eu escolhi. No Japão, inclusive. Vou fazer alguns cursos de queijos também por aqui (no Brasil). A ideia é voltar (ao Japão) já com um evento de harmonização de queijos com saquê. Também quero trabalhar mais com harmonização de saquês com gastronomia brasileira.

No Brasil, tive a oportunidade de trabalhar com harmonização com chefs grandes como o Rodrigo Oliveira, o Pablo Inca e a Telma Shiraishi. Foi no Festival do Sake. Tive a honra de ser convidado pelo Fabio Ota para trabalhar na seleção dos saquês para os jantares do evento. Então, esse contato com os chefs e com a gastronomia feita no Brasil me deixou mais preparado para fazer o mesmo no Japão. Acho que ataco duas frentes aí, que é o saquê e a difusão da gastronomia brasileira no Japão, algo que está guardadinho aqui comigo e espero poder realizar quando retornar.

 

Você tem outras paixões (queijo, turismo, produção de vídeos…). Como ficou tudo isso com a pandemia? Como se adaptou à nova realidade e o que espera para este ano?

 

Acho que essas coisas tão dispersas começaram a se juntar melhor esse ano. E acredito que o turismo ainda vá patinar mais alguns meses. Mas esse tempo está me dando possibilidade de organizar as coisas e criar experiências mais completas para o público, seja o virtual, seja o presencial. Estou com planos de circular bastante em 2022 e quero poder levar comigo essas experiências que vivi durante a pandemia e compartilhá-las com as pessoas, que é o que eu mais gosto.

 

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