Casais com crianças estão reorganizando a rotina e pegando os deveres semanalmente na tentativa de reduzir os riscos da exposição na escola

 

 

 

Texto: Ana Paula Ramos
Thaissa Miyazaki, o marido Allan Ferreira e o filho Murillo – Foto: Arquivo pessoal/Cedida

 

 

 

As expectativas para este ano eram de melhora no cenário da pandemia com a distribuição das vacinas, mas não é o que vem acontecendo no Japão.

 

Desde julho, os casos têm aumentado em várias regiões do país e a disseminação da variante delta, mais contagiosa que a primeira versão do coronavírus, passou a infectar mais pessoas jovens e a pressionar os hospitais. 

 

Para muitas famílias brasileiras, o aumento de novos casos na cidade ou província, as internações e o agravamento de sintomas, principalmente em pacientes jovens ou de meia-idade, trouxeram um dilema: mandar ou não os filhos para a escola considerando os riscos.

 

Se por um lado há um prejuízo em manter as crianças em casa, como as preocupações com a rotina e o trabalho, por outro há o receio dos filhos acabarem pegando o vírus na convivência com outras crianças e professores em sala de aula.

 

A reportagem da Record TV Japan conversou com famílias brasileiras em províncias diferentes e descobriu que muitas escolas estão adaptando os cronogramas, reduzindo o horário e dividindo as turmas para intercalar as aulas presenciais e fortalecer a prevenção.

 

O Ministério da Educação, Cultura, Esportes, Ciências e Tecnologia (MEXT), disponibilizou uma página com orientações para as escolas sobre como agir em meio ao receio dos pais. De um modo geral, o órgão explica que é papel da escola deixar claro o plano preventivo que está sendo executado e trazer um pouco de tranquilidade para as famílias preocupadas.

 

No entanto, os pais podem decidir não mandar os filhos para a aula por vários motivos além da simples preocupação, como ter pessoas do grupo de risco em casa ou estar acontecendo uma explosão de casos na região.

 

Neste caso, o MEXT orienta as escolas para não registrar a suspensão do aluno como falta e definir o período de ausência em que a criança fará os deveres semanais em casa. O mesmo vale para as crianças que acabaram de retornar do exterior e devem se ausentar durante duas semanas por motivos de quarentena.

 

Preocupações e indecisão

 

Franciely Kimura (30), tem passado pela indecisão com relação à escola desde o início do mês, quando terminou as férias de verão dos filhos Akira (9) e Akio (7). A família vive em Oizumi (Gunma) e na escola das crianças, as aulas estão intercaladas em tentativa de reduzir os riscos.

 

Por causa do aumento de casos na região, ela e o marido decidiram não mandar as crianças para a escola por enquanto. “É uma nova rotina depois de mais um mês de férias. Os meninos ficaram bastante tempo em casa e foi uma surpresa esse volta e não volta. É muito difícil essa dúvida sobre mandar ou não. É difícil de colocar na balança e nós não estávamos preparados para isso”, diz.

 

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Thaissa Miyazaki e o filho Murillo Hideki

O risco de mandar os filhos para a escola gera receios, mas deixar as crianças em casa também é problemático. “É complicado manter as crianças o tempo todo em casa, precisamos sair para trabalhar. Todas as atividades foram suspensas, desde a natação até a aula de português. A escola era o único momento de descontração e para rever os colegas. Tem sido um período bem difícil mesmo”, desabafou.

 

Em Minokamo (Gifu), Thaissa Miyazaki (34) também seguiu pelo mesmo caminho. Mãe de Murillo Hideki (11), que está no 6° ano do primário, a brasileira e o marido decidiram pegar os deveres para o filho fazer em casa enquanto a situação não melhora. “Na escola dele as crianças estão indo apenas meio período. Eu achei que não valia a pena arriscar com tantos casos e enviá-lo para a escola agora. Estamos monitorando em casa e nos organizando para trabalhar”, contou.

 

Dificuldades em casa

 

Em Funabashi (Chiba), Ana Flora Otani (52) está com medo das contaminações e, ao mesmo tempo, preocupada com a possibilidade de a escola parar sem um suporte para as famílias. Mãe de Yumi (10), ela conta que passou pelo mesmo problema no início da pandemia no ano passado, mas teve uma ajuda do governo que permitiu dar assistência para a filha em casa.

 

Ana Flora Otani e a filha Yumi

“Foi em abril do ano passado, quando intensificaram os pedidos para ficar em casa. Eu podia trabalhar por ser da área de alimentos, mas optei pela ajuda porque a produção estava baixa. Eu fiquei o mês de maio em casa com a minha filha”, conta.

 

Depois de um início de setembro tenso, Ana recebeu um comunicado da escola na quinta-feira (9), informando que as crianças terão o horário de aulas reduzido até o dia 26 de setembro. “Eu estou com medo da escola parar de novo. Se não tiver ajuda do governo desta vez não sei como farei. A minha filha já recebeu um iPad fornecido pela escola para ser utilizado caso não tenha aula presencial”, relatou.

 

É difícil contornar a situação, a rotina do trabalho e dar suporte para aos filhos que estão em durante os períodos de maior risco de contaminação. As crianças sofrem o risco de se infectar na escola e os adultos também precisam enfrentar a exposição no ambiente de trabalho.

 

“A gente vê que o vírus começa a cercar. Já teve infectados na fábrica, um ou outro funcionário neste um ano e meio de pandemia. Uma amiga da fábrica chegou a ficar doente com a família toda, nora, filho, netos e até dois bebês gêmeos. A gente fica assustado”, diz.

 

E a necessidade de manter o vírus longe de casa se tornou ainda mais importante na 5ª onda da pandemia no Japão, marcada pelos numerosos casos que estão sofrendo o drama de tratar a doença dentro de casa e, ao mesmo tempo, evitar que os familiares se contaminem.

 

De acordo com os dados do Governo de Tóquio, até o dia 10 de setembro, cerca de 11 mil doentes estavam em tratamento em casa e desde o mês de agosto, 35 infectados vieram à óbito antes de conseguir uma vaga de internação.

 

Esta situação também tem aumentado o contágio dentro das famílias. Segundo o levantamento diário da emissora NHK, na sexta-feira (10) foram registrados mais 1.242 casos de coronavírus em Tóquio. Deste número, foi possível traçar a rota de contaminação de 533 pessoas e 351 delas pegaram o vírus no ambiente doméstico.